quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Análise


Ontem à tarde fui ao psicólogo.
Eu me sentei e perguntei se podia fumar um cigarro.
Ele, o psicólogo, me disse que ele detestava esse hábito, mas que se quisesse mesmo, então sim, tirei do bolso um cigarro e o acendi com as mãos meio trêmulas.
Lembro-me que meu sistema nervoso não era tão abalado assim, prefiro atribuir isso à cafeína, mas não sei dizer ao certo.
Enquanto acendia meu cigarro o médico falava coisas como:
- Eu entendo que você deve ter passado por coisas ruins e da qual não se orgulha, mas entenda que eu estou aqui para ajudar, eu gostaria de saber se você vai cooperar, até por que essa sessão faz parte da sua sentença proferida pelo juiz.
Que hipócrita, pensei, é como se ele tivesse dito que minha atitude de não falar com ele resultaria num telefonema no qual dentro de algumas horas eu estaria cumprindo uma pena de 08 meses.
O que disse foi:
- Ok! Pode contar comigo.
- Ótimo, para começar você pode me contar um pouco de você, dos seus problemas, ou se quiser dos seus sonhos, talvez do por que ter apontado uma arma para um comerciante e duas pessoas numa loja de conveniências, depois ter as mandado saírem, destruído tudo lá e no final dado um tiro em si mesmo.
            Entre uma tragada e outra comecei a me perguntar internamente, que porra de psicólogo é esse?
A resposta foi:
- Bem, não me lembro direito como aconteceu, não consigo lembrar o que estava pensando naquele momento, mas acho que a questão, a raiz de tudo isso esteja nos meus primórdios.
- Que espécie de primórdios?
- O senhor quer saber os meus primórdios doutor? Pois vou lhe contar.
O meu pai era um bêbado, inúmeras vezes eu o vi chegar a casa sujo, ferido, com hálito de álcool, patético.
Ele falava alto, vomitava, maldizia tudo e todos, mas o pior não era isso, ele também batia na minha mãe.
É uma história clássica, pai bêbado, mãe omissa e espancada e o filho que se torna instável e rebelde, mas sempre foi muito difícil pra mim. Quando cresci mais um pouco a raiva e o ódio eram tão grandes que minha vista escurecia e minha cabeça doía, certa vez ele batia nela e tudo em mim explodiu como fogos de artificio. Eu pulei em cima dele, segurei seus cabelos e dei socos nas costas, mas ele era mais forte e me chutou a barriga, quando cai ele se levantou e pegou uma cadeira, olhe para essa cicatriz na minha testa doutor, esse é o resultado daquela cadeira.
Deitado lá no chão eu tentava esboçar alguns movimentos, as órbitas dos meus olhos se encheram de sangue e tudo ficou vermelho, e a última coisa que vi antes de desmaiar foi meu pai deferindo socos contra a minha mãe por ela ter vindo tentar me defender.
Ai eu completei 15 anos e comecei a fumar, beber (é claro que nunca fiquei bêbado como meu pai) usei maconha, crack, LSD, e heroína algumas vezes, parei de ir escola e vivia na casa de amigos.
Numa festa eu conheci o Erick, ele fumava crack naquele momento e me ofereceu. No final da noite a gente estava transando no banco de trás de um carro.
A gente namorou por algum tempo, 16 meses pra ser mais exato, depois peguei ele na cama com outro cara e a gente terminou após eu cortar a cara dele com um pedaço de vidro.
A solução que encontrei foi vir pra essa cidade, tentar recomeçar, arranjei uns empregos horríveis, mas sempre roubava alguma coisa ou nem aparecia, no final ninguém mais me contratava, meu estado era bem aparente, então aconteceu meu pequeno incidente que me fez estar aqui hoje.
Olha doutor, eu não sei quem eu sou, nem o que sinto, nem o que quero e nem pra onde vou, a única coisa que sei é que as respostas pra todas essas perguntas não estão aqui, então é melhor tornarmos isso uma conveniência para nos dois, não me enche e eu não te ferro.
Foi isso que eu disse ao psicólogo, agora estou aqui fumando um último cigarro com um revolver na mão.
É impressionante como essas coisas são fáceis de se conseguir hoje em dia.
Devo acabar o que comecei...
Na cabeça é bem melhor...

By: Daniel Yasendick